Construir resiliência à infodemia: Uma prioridade de saúde pública na era da desinformação sobre vacinas

Construir resiliência à infodemia: Uma prioridade de saúde pública na era da desinformação sobre vacinas

Por Jessica Malaty Rivera

Jessica Malaty Rivera

Nos últimos cinco anos, o mundo teve uma verdadeira lição intensiva em saúde pública. Uma avalanche de manchetes carregadas de jargão científico causou bastante confusão, pânico e medo. Esta dinâmica não é nova e, na verdade, tem um nome na epidemiologia: infodemia.

A epidemiologia pergunta-nos onde, quando, porquê e a quem se está a espalhar uma doença e de que forma afeta a saúde da população. A infodemiologia faz essas mesmas perguntas, mas sobre a informação que se propaga e como esta afeta as decisões das populações.

Pensemos assim: as infodemias estão para a infodemiologia como as epidemias estão para a epidemiologia.

Infodemias não significam necessariamente uma propagação de informação falsa. Por vezes, é apenas informação a mais, dificultando a tarefa das pessoas de navegarem por esse mar de dados e distinguirem o que é fiável e de fontes credíveis. Isto aplica-se de forma particularmente grave ao mundo das vacinas.

A desinformação sobre vacinas, que tem minado a confiança, atrasado campanhas de vacinação, causado o reaparecimento de doenças anteriormente eliminadas e ameaçado a segurança da saúde global, está a propagar-se com rapidez e amplitude, alimentada pelos nossos ecossistemas digitais de informação. Ao olharmos para o futuro, construir resiliência à infodemia deve ser uma prioridade absoluta para os sistemas de saúde pública, decisores políticos e comunidades.

O que é a resiliência à infodemia?

A resiliência à infodemia refere-se à capacidade de uma sociedade resistir, identificar e responder a informações falsas ou enganosas sobre saúde, especialmente durante emergências de saúde pública. Não se trata apenas de verificar factos ou desmentir afirmações falsas, é sobre desenvolver o pensamento crítico, a confiança e infraestruturas de comunicação que consigam filtrar o ruído e amplificar as vozes credíveis.

No contexto das vacinas, isto significa proteger as pessoas contra desinformação perigosa que leva à hesitação, recusa vacinal e, em última instância, a doenças e mortes evitáveis.

O alto custo da desinformação sobre vacinas

As consequências da desinformação vacinal não controlada são imediatas e de longo prazo. Temos assistido a surtos de sarampo e tosse convulsa em comunidades com baixas taxas de vacinação, resistência às vacinas contra a COVID-19 apesar de provas científicas esmagadoras, e ao ressurgimento de doenças preveniveis onde a desinformação prospera.

Estes impactos não afetam apenas indivíduos, enfraquecem a imunidade de grupo, sobrecarregam os sistemas de saúde e levam a perdas de vidas que podiam ser evitadas. Para além disso, afetam desproporcionalmente comunidades marginalizadas e pessoas imunocomprometidas ou clinicamente vulneráveis. Quando não é contrariada, a desinformação transforma-se numa forma de injustiça em saúde.

Porquê agir agora

O ecossistema digital está a evoluir rapidamente. As redes sociais facilitam a disseminação de conteúdos enganadores que se tornam virais em segundos. Os algoritmos tendem a favorecer conteúdos carregados de emoção, medo, indignação ou teorias da conspiração, em detrimento de informações rigorosas e baseadas em evidência. Embora as plataformas tecnológicas tenham responsabilidade, não podemos depender apenas da moderação de conteúdo. Precisamos de comunicação científica proativa, não apenas reativa.

A resiliência constrói-se antes de uma crise – não durante. Com futuras pandemias prováveis e campanhas de vacinação rotineiras em curso, a nossa capacidade de resposta depende da eficácia com que comunicamos e fomentamos a confiança. Aqui estão algumas estratégias para Construir Resiliência à Infodemia:

1- Investir na literacia em saúde e dados
A comunicação em saúde pública deve ir além do “o quê” e explicar o “porquê”. As pessoas confiam mais na informação que compreendem e que percebem como relevante para as suas vidas.

2 -Colaborar com mensageiros de confiança
Líderes locais, profissionais de saúde, líderes religiosos e até influenciadores podem ser poderosos aliados na promoção de informação fidedigna sobre vacinas. As pessoas confiam mais noutras pessoas do que em instituições. Formar e equipar estas vozes pode expandir significativamente o alcance da mensagem.

3 – Privilegiar a comunicação transparente e compassiva
Envergonhar ou ridicularizar quem acredita em desinformação raramente resulta. Precisamos de uma comunicação empática, que valide preocupações, responda a medos e forneça factos claros e consistentes sem julgamento.

4 – Apoio político e colaboração global
Organizações como o Rotary, Shot at Life, UNICEF e OMS já estabeleceram as bases para enfrentar os desafios atuais e proteger contra futuras infodemias através da mobilização social, sensibilização pública e incentivo a políticas que promovam transparência e a colaboração entre instituições de saúde e plataformas tecnológicas.

A resiliência à infodemia não é apenas uma responsabilidade dos profissionais de saúde, é um desafio de toda a sociedade. Pais, educadores, jornalistas, cientistas, técnicos de tecnologia e líderes comunitários desempenham um papel fundamental na criação de um ambiente informativo saudável.

Na luta contra doenças infeciosas, as vacinas salvam vidas, mas só se as pessoas confiarem nelas. Essa confiança depende das histórias que se contam, da informação a que se tem acesso e das comunidades em que se vive. Ao construir resiliência à infodemia, estamos a criar uma sociedade mais forte, mais saudável e mais informada, uma sociedade capaz de enfrentar a próxima crise de saúde com confiança, e não com confusão.

Jessica Malaty Rivera é epidemiologista de doenças infeciosas e comunicadora científica premiada. Nos últimos 20 anos, dedicou-se à vigilância de doenças emergentes, políticas de saúde pública e defesa da vacinação. Especializa-se em traduzir conceitos científicos complexos em informação acessível, sem julgamentos, para públicos diversos. Pode segui-la no Instagram (@jessicamalatyrivera) e no Substack (@makingsciencemakesense).

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